quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Em vias de preparação...*


                                                                                                                                                                          * Oscar Rodas. 20 fev. 2014.

Posicionamo-nos num dos momentos mais ímpares de nosso ano, a aproximação do carnaval, da quarta-feira de cinzas. Esta, ingrata ou não, nos remete a todo um foco da criação das datas e seus símbolos. Isso porque, ela retrata uma das formas mais antigas de se contar uma data, o dia após o outro. Para quem não sabia, o dia da Páscoa cai sempre no primeiro domingo, da primeira Lua Cheia da primavera no hemisfério norte, ou do nosso outono. Uma herança gregoriana e cheia de símbolos para o momento em que se vive.

O momento torna-se crucial, pois para o cristão inicia-se a preparação, na rica história cultural que nos leva, o carnaval antecipa a toda e qualquer forma de purificação, e para se tornar puro, há de se experimentar um pouco da futilidade da carne. Do desespero de deixar-se tentar, o proibido vira regra e a vida uma baderna. O Espírito, no período de carnaval, não goza de nada, apenas se espreme numa caixa da memória, que, no entanto, ao bom cristão, e ao bom humano, retornará com vigor. Assim é o crescimento do espírito um recolher-se e observar. Na sua caixinha espremida, fica só e observa como se manifestam as vontades do corpo. Diz um bom ditado [meu] indiano: só sabe diferenciar o mel, aquele que experimentou o fel. Buscando um eterno encontrar-se, o humano experimenta muitas coisas, entre o pecado e o amor; entre o prazer e a dor. Alguns se deliciarão no meio de alucinógenos e psicotrópicos, outros apenas o presenciar, o sentir e estar no meio do embaraço da multidão, sentindo-se esmagados, se entorpecerão. Talvez ai esteja um pouco da certeza de que o espírito permanece espremido, pois nele só há consciência enquanto uns sabem sempre onde se encontrar, outros se perdem e permanecem dopados. Bom, viva a celebração do corpo, é bom, é salutar.

Por outro lado, a 40 dias da páscoa, encontra-se a quarta-feira de cinzas. Um reencontro, fruto da realidade cotidiana. Talvez muitos ainda estejam perdidos, mas com certeza, boa parte dos cristãos tentam se reencontrar. Hora daquela consciência voltar a se espriguiçar, em meio a dores musculares, morais. O Espírito retorna num pranto, parece um pó que tem que ser restaurado, relembrado. Inicia-se um novo ciclo espiritual em vias de preparação para uma Luz que permanece eternamente ao nosso entorno, dentro de nós. Preparamos um espírito mais renovado, com novos desejos. Alguns ainda estão dopados, e assim, infelizmente, permanecerão. Nunca verão seus sonhos como perspectivas de futuro. O momento de quarenta dias torna-se isso, uma recriação das perspectivas, estas mudam a cada fase da vida ou evoluem, a depender do espírito que sabe se espremer. Nós humanos somos simbólicos, culturais, arraigados e desejosos de bons exemplos, de vidas que souberam viver e permaneceram eternas. 

De toda sorte, alguns conseguem perceber os sinais que os Céus nos trazem, e quer melhor símbolo do que esse, o da Lua reluzente na janela das estrelas? Quem não gostaria de ser aquela estrela, ao lado daquele Astro que reluz a estrela que nos centra, o Sol? Para alguns não é fácil dizer que ficar quarenta dias esperando se renovar, na forma da vida que se inova – primavera – é um símbolo da transformação interior, da expectativa de se centrar, no Astro Rei. Olhar para a Lua Cheia na Páscoa é sinal de que não ficamos sem o caminho mesmo no escuro, de que o Sol brilha mesmo com o dia ausente. Então façamos, vivamos a carne, pois sem ela o espirito não é escondido; sem o esconderijo não há quietude, nem evolução; sem evolução não há consciência de que não se vive nesse mundo em um torpor profundo; e, se vivemos nesse mundo, buscamos todos os dias sinais de como encontrar um eixo, um equilíbrio. Ocorre que, isso sempre está além e aquém do nosso alcance. Mas continuemos, vamos contar cada dia que passa para chegar à conclusão de que estamos sempre em vias de preparação.

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